O Acervo Origens é uma iniciativa do violeiro, pesquisador e produtor musical Cacai Nunes e visa pesquisar, catalogar, divulgar e compartilhar conteúdos musicais na internet e em atividades culturais das mais diversas como shows, saraus, bailes de forró e programas de rádio. Ao identificar, articular e divulgar a música brasileira, sua história e elementos – entendidos como o conjunto entrelaçado de saberes, experiências e expressões de pessoas, grupos e comunidades, sobre os mais diversos temas – o ACERVO ORIGENS visa contribuir para a geração e distribuição de um valioso conhecimento, muitas vezes ignorado e disperso pelo território nacional.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sambistas de raça - Ismael Silva e Ataulfo Alves (28/07/2011)

Eis uma coletânea, lançada em 1972, com clássicos de Ismael Silva e Ataulfo Alves, em gravações originais feitas na década de 1950, depois de passarem pelo moderno processo de beneficiamento nos laboratórios da Phonogram (conforme descrito da contracapa). O disco é o volume 10 de uma série de coletâneas de qualidade indiscutível. Ele tem, no Lado A, composições de Ismael Silva e, no Lado B, Ataulfo Alves. Abaixo, as notas sobre as biografias desses dois grandes nomes da música brasileira.

ISMAEL SILVA

Ismael Silva nasceu em 14 de setembro de 1905, em Niterói. Como perdeu o pai aos três anos, mudou-se com a mãe para o bairro Estácio de Sá. Começou a compor na adolescência, e virou freqüentador dos bares e da boemia da área. Um dia, o cantor Francisco Alves, grande nome do rádio, ofereceu 20 mil réis pela autoria de um samba de Ismael, que, doente em um quarto de hospital, acabou aceitando, e a canção “Me Faz Carinhos” foi lançada com voz e autoria de Francisco Alves. Depois dessa, várias composições, cuja autoria era apenas de Ismael, levaram o nome de Ismael, Francisco Alves e Nilton Bastos, outro parceiro de Ismael. Foi, porém, o ano de 1928 que viria mudar a vida de Ismael e, não é exagero afirmar, a história da música popular brasileira. Ismael fundou a “Deixa Falar”,  primeira Escola de Samba do Rio de Janeiro, do Brasil e do mundo. A Deixa Falar desfilou em 1929, com Ismael à frente. Nos anos seguintes, Ismael compôs e gravou três grandes sucessos: Não háNem é bom falar e Se Você Jurar, em parceria com Nilton Bastos. A perda precoce do parceiro acabou aproximando Ismael de Noel Rosa, com quem ele compôs Para Me Livrar do MalAdeusUma Jura que Fiz, e muitas outras.
A maré boa na vida de Ismael foi interrompida porque, em 1935, Ismael foi preso por atirar em um homem. O malandro estava se engraçando com sua irmã, e Ismael acertou-lhe a bunda com vários tiros. Ele foi condenado a cinco anos de prisão, mas saiu em 1938 por bom comportamento. Quando saiu, não podia receber notícia pior: seu grande parceiro, Noel Rosa, havia falecido. Ele ficou tão perdido que acabou se isolando e se afastando do samba. Ele retornou ao samba em 1950, quando Alcides Gerardi gravou sua composição Antonico, inspirada em uma carta de Pixinguinha para Mozart de Araújo, em que o maestro pedia ao amigo um emprego para o sambista em dificuldade.  Depois disso, Ismael passou a freqüentar o Zicartola, gravou alguns LPs e voltou à cena musical. Malandro da gema, orgulhava-se de nunca ter tido um emprego fixo na vida. Ele faleceu em 1978, vítima de um ataque cardíaco. Teve uma filha de sangue, com uma passista de escola de samba, mas nunca assumiu a paternidade. Dizem que ele era homossexual, e que a tal passista foi a única mulher com quem ele se envolveu. Mas ele teve filhos no samba. Chico Buarque assumiu sua filiação, dizendo que seu pai musical sempre foi Ismael Silva. Ele inclusive doou um cheque que ganhou como premiação do Governo do Estado da Guanabara para Ismael. Este demorou para descontar o cheque, para mostrar aos amigos o carinho do filho pródigo. O pai das escolas de samba, certa vez, na década de 1970, precisou mendigar uma entrada para assistir ao desfile oficial no carnaval. Indignado, escreveu um bilhete para os órgãos oficiais, em que dizia que não é justo que a criação [as Escolas de Samba] recebam auxílio do governo, enquanto o criador cai no esquecimento. Diante disso, acabou ganhando duas entradas. Que sirva de lição, para que nunca, jamais, nos esqueçamos daqueles que deixaram para nós o nosso maior tesouro, nossa música e nossa cultura.

ATAULFO ALVES

Ataulfo Alves nasceu em uma fazenda em Miraí, Minas Gerais, em 2 de maio de 1909. Seu pai tocava viola, sua mãe gostava de cantar, e a fazenda onde ele cresceu era frequentemente visitada por repentistas, sanfoneiros e todo o tipo de músicos. Foi, então, desde sempre que Ataulfo teve contato com a música. Na infância, enquanto seu pai era vivo, brincava de responder aos seus repentes, aprendendo naturalmente a arte da composição. Com a morte do pai, a família saiu da fazenda para viver na cidade de Miraí, e Ataulfo, que era o filho mais velho, assumiu a responsabilidade pela mãe e pelos irmãos. Ainda menino, trabalhou como apanhador de malas na estação de trem, engraxate, menino de recados, leiteiro, marceneiro, marmiteiro, plantador de café, condutor de bois. Na adolescência, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi entregador de recados, ajudante de lanterneiro, lavador de vidros e prático de farmácia. Quando saía do trabalho, ia para as rodas de samba. Muito jovem, Ataulfo imergiu profundamente no universo do samba. Ele participou ativamente da criação das primeiras escolas de samba, e, tanto pelo talento musical, quanto pela elegância e gentileza, era um sujeito demasiadamente querido por todos. No Estácio, conheceu o Alcebíades Barcelos (o Bide), que levou Ataulfo para os esquemas profissionais do samba, a saber, o rádio e os shows. Durante a Era de Ouro do Rádio, iniciada na década de 1930, Ataulfo consolidou sua carreira de compositor. Em 1933, teve sua primeira composição gravada, a música Sexta-Feira; mas o primeiro grande sucesso, Saudades do Meu Barracão, ele gravou em 1935. Por não possuir grande potência vocal, Ataulfo, a princípio, não gravava, apenas compunha. No ano de 1941, porém, Ataulfo compôs, em parceria com Mário Lago, o samba Ai Que Saudades da Amélia, só que nenhum cantor quis gravá-la para lançá-lo no carnaval de 1942. Então, Ataulfo gravou, acompanhado pelo grupo vocal Academia do Samba e por Jacob do Bandolim. Nem é preciso descrever o sucesso que a música fez, tanto que se transformou em um clássico da MPB.
Depois do estouro do samba para Amélia, Ataulfo assumiu a carreira de cantor, e montou um conjunto com vozes femininas, chamado Ataulfo e Suas Pastoras. Foi ele, então, quem inventou o acompanhamento por vocais femininos no samba, prática que, posteriormente, virou moda. Ataulfo teve cinco filhos com sua esposa Judite, com quem se casou em 1928. Ele faleceu em 1969, vítima de complicações em uma cirurgia para úlcera. Ele deixou mais de trezentas composições, todas elas impecáveis. Dentre seus grandes sucessos, podemos citar: Ai, que saudades de Amélia, Atire a primeira pedra, Leva meu samba, Laranja madura, Meus tempos de criança, Mulata assanhada, Na cadência do samba, Pois é. Seu estilo é marcado por unir suas influências musicais primeiras, vindas do interior de Minas Gerais, com o samba que saía dos morros cariocas.


Lado A

01-Se você jurar (Ismael Silva – Nilton Bastos – Francisco Alves)
02-Que será de mim (Ismael Silva – Nilton Bastos – Francisco Alves)
03-Adeus (Ismael Silva – Nilton Bastos – Noel Rosa)
04-Sofrer é da vida (Ismael Silva – Nilton Bastos – Francisco Alves)
05-Novo amor (Ismael Silva)
06-Pra me livrar do mal (Ismael Silva – Noel Rosa)
07-Nem é bom falar (Ismael Silva – Nilton Bastos – Francisco Alves)
08-Me diga teu nome (Ismael Silva)

Lado B

01-Laranja madura (Ataulfo Alves)
02-Atire a primeira pedra (Ataulfo Alves – Mario Lago)
03-Ai! Que saudades da Amélia (Mario Lago – Ataulfo Alves)
04-Sai do meu caminho (Ataulfo Alves)
05-Sei que é covardia (Ataulfo Alves – Claudionor Cruz)
06-Vida de mina vida (Ataulfo Alves)
07-Mulata assanhada (Ataulfo Alves)


CLIQUE AQUI PARA BAIXAR



Nenhum comentário: