Texto: Gabriela Tunes
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A postagem de
hoje traz esse belíssimo álbum, gravado por Joel Nascimento, um capítulo
importante da bela história que o bandolim fez no Brasil.
1976 - Chorando pelos dedos
Surgido na
Itália, entre os séculos XV e XVII, o bandolim
descende do alaúde, e, espalhando-se pela Europa, adquiriu diversos
formatos e sonoridades. No Brasil, esteve presente nas primeiras gravações
mecânicas realizadas no início do século XX pela Casa Édison, e o primeiro
bandolinista célebre, reconhecido pelo virtuosismo, relatado inclusive no livro
pioneiro Choro: Reminiscências dos
Chorões, do carteiro e chorão Alexandre Gonçalves Pinto, foi Luperce
Miranda. Nascido em Recife, em 1904, aos 28 anos de idade foi morar no Rio de
Janeiro. Luperce apresentava virtuosismo impressionante, com técnica e
sonoridade típicas dos bandolinistas napolitanos, embora os utilizasse em
repertórios nordestinos. Mais jovem do
que Luperce, Jacob do Bandolim foi sem dúvida o grande marco na história do
bandolim brasileiro. Embora tenha
iniciado seu aprendizado em um bandolim napolitano, o estilo de Jacob foi
inspirado na guitarra portuguesa, cuja sonoridade e técnica ele considerava
mais próximos da música brasileira. Ele trocou o bandolim napolitano, em
formato de cuia, por um bandolim achatado, parecido com a guitarra portuguesa.
Essa fusão física e sonora entre o bandolim italiano e a guitarra portuguesa,
empreendida por Jacob, iria designar a trajetória do bandolim brasileiro dali
por diante. Jacob inovou em diversos
aspectos, notadamente no que diz respeito à interpretação dos choros, cujas
notas, ornamentos, frases, improvisos, orientados pelo seu incrível senso
estético, eram minuciosamente escolhidos, de forma a não sobrar nem faltar
nada. Do mesmo modo, ouvindo as gravações antigas, percebe-se nitidamente que
Jacob aperfeiçoou a sonoridade do bandolim, tanto no que diz respeito à
produção do som, quanto em relação à captação e gravação, e o resultado de seu
intenso e apaixonado trabalho, além das performances ao vivo, que somente quem
estava lá viu, são seus discos. Lindos, insuperáveis, até mesmo pelo virtuose
dos virtuoses do bandolim, que poderá porventura surgir daqui a mil anos. Por
isso, Jacob do Bandolim foi amplamente imitado, deixando como legado uma sólida
escola.
Joel Nascimento
justamente figura entre os grandes discípulos de Jacob. Joel nasceu no dia 13
de outubro de 1937, no subúrbio da Penha. Na adolescência, foi estudar piano,
e, logo depois, acordeom. Aos 18, Joel ingressou no Conservatório Brasileiro de
Música, e lá permaneceu por alguns anos, até que foi acometido por uma
osteoclerose, que lhe deixou surdo do ouvido esquerdo. Como ele já trabalhava,
largou a música. Mais tarde, quando ele já passava dos trinta anos, voltou a
tocar, agora cavaquinho, e a freqüentar rodas de choro. Um dia, ganhou um
bandolim de presente. Joel foi tocando cada vez mais, conciliando a vida de
músico amador com o emprego de técnico em radiologia. Somente em 1974, ele
começou a atuar como bandolinista profissional, já demonstrando enorme talento.
Ainda na década de 1970, Joel foi solista da Camerata Carioca, um dos grupos
mais importantes da história recente do Choro. Além de Joel Nascimento, a
Camerata Carioca tinha Celsinho Silva no
pandeiro, Luciana Rabello no cavaquinho, e Luiz Otávio Braga, Maurício Carrilho
e Raphael Rabello nos violões.
No ano de 1976, pela gravadora Odeon, Joel Nascimento lançou seu primeiro disco,
que postamos hoje aqui. "Chorando
pelos dedos" foi produzido por João Nogueira, e contou com um conjunto de
instrumentistas simplesmente estarrecedor, tais como: Guinga, Paulo Moura,
Jorginho da flauta, Luis Roberto; tem ainda Dino 7 Cordas, Cláudio Jorge, nas
seis cordas, Canhoto, no cavaquinho, Jorginho, no pandeiro, Abel Ferreira na
clarineta e Zé da Velha, no trombone, entre vários outros. Como o disco não tem
ficha técnica, e esses grandes músicos fizeram participações em algumas faixas,
não dá para saber exatamente quem toca em qual. Ouvindo atentamente, percebemos
as nuances interpretativas que Joel herdou de Jacob, nas palhetadas firmes,
ornamentos e dinâmicas. O destaque, inclusive, é a primeira faixa do Lado A,
Ecos, de autoria de Joel, em que ele, em alternâncias de dinâmica, simula o
efeito do eco. Cabe destacar também o Chorinho do Sovaco de Cobra, que tem Dino
7 Cordas, Canhoto, no cavaquinho, mais Abel Ferreira e Zé da Velha, dividindo
solos e contrapontos geniais. No dicionário Cravo Albin da música brasileira,
tem uma passagem que conta que o disco foi lançado exatamente no bar Sovaco de
Cobra, um boteco copo sujo típico de chorões, em uma festa antológica. Sorte de
quem viu.
Fontes:
MOURA, Jorge Antonio Cardoso. Tradição e
inovação na prática do bandolim brasileiro. 2011. 142 p. Dissertação de
Mestrado - Universidade de Brasília.
Disponível em http://repositorio.unb.br/handle/10482/10040.
CORTES, Almir. O Estilo Interpretativo de
Jacob do Bandolim. 2006. 142 p. Dissertação de Mestrado, Universidade de
Campinas. Disponível em
Dicionário Cravo Albin da Música Brasileira,
em www.dicionariompb.com.br
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