O Acervo Origens é uma iniciativa do violeiro, pesquisador e produtor musical Cacai Nunes e visa pesquisar, catalogar, divulgar e compartilhar conteúdos musicais na internet e em atividades culturais das mais diversas como shows, saraus, bailes de forró e programas de rádio. Ao identificar, articular e divulgar a música brasileira, sua história e elementos – entendidos como o conjunto entrelaçado de saberes, experiências e expressões de pessoas, grupos e comunidades, sobre os mais diversos temas – o ACERVO ORIGENS visa contribuir para a geração e distribuição de um valioso conhecimento, muitas vezes ignorado e disperso pelo território nacional.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Moreno e Moreninho e Sua Embaixada (30/08/2011)

Os irmãos Pedro Cioffi, o Moreno, e João Cioffi, o Moreninho, nasceram em Machado, Minas Gerais, em 27/12/1925 e 29/09/1927, respectivamente. A infância dos meninos foi na lida da roça, ambiente em que a viola e a música caipira são temas dos sonhos da maioria dos garotos. Como estavam sempre juntos e gostavam de música, começaram a cantar e tocar, de forma natural. Eles são irmãos de outra dupla muito conhecida da música caipira, Riachão e Riachinho. Na década de 40, começaram a trabalhar como artistas na Rádio Poços de Caldas, onde permaneceram por cinco anos. Depois, mudaram-se para São Paulo, e lá se apresentavam na Rádio Record. O primeiro 78 rpm foi gravado em 1954, no Rio de Janeiro, pela gravadora Sinter, com as músicas "Namoro Moderno" (José Eloy Garcia - Moreno), no Lado A, e "Nossa Senhora Aparecida" (Moreninho), no Lado B.  Muito ligados ao folclore mineiro, gravaram cantigas da tradição musical de Minas Gerais. Um de seus maiores sucessos foi a Congada "Treze de Maio" (Teddy Vieira - Riachão - Riachinho), gravada em 1956. Esse disco tem canções do Reisado, ou Folia de Reis. O reisado é um cortejo religioso, realizado em vários estados do Brasil, que ocorre entre o Natal e a Festa de Reis, dia 6 de janeiro. O cortejo representa a história da viagem dos três Reis Magos à gruta de Belém. Cada grupo que realiza o cortejo dá ao ato as interpretações e nuances que acham melhor, e, por isso, a Folia de Reis é uma manifestação da cultura popular muito rica. Então, ouçam, com devoção, as músicas de Moreno e Moreninho para a Folia de Reis.


   Lado A

                01-Bandeira do divino (Moreno-Roque José de Almeida)
                02-Natal, natal (Moreno-Moreninho)
                03-Benças de Nossa Senhora (Céu Azul-José Carlos Cioffi)
                04-Cantigas de Reis (Moreno-Moreninho)
                05- O rei já chamou (Moreninho-Chagas-Zé Alves)
                06-Bandeira de Santos Reis (Moreno-Moreninho)

   Lado B

01-Dança de São Gonçalo (Moreno-Moreninho-M. Carmona)
02-Folia de São Sebastião (Moreno-M. Carmona-Zé Alves)
03-Capelinha de Santos Reis (Moreno-Moreninho)
04-Três reis do oriente (Moreno-Moreninho)
05-Encontro do presépio (Moreno-Moreninho)
06- Estrela do oriente (Moreno-Moreninho)



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sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Altamiro revive Pattápio e interpreta clássicos (26/08/2011)

O título desse disco reúne dois dos maiores flautistas brasileiros de todos os tempos. Pattápio pertence às primeiras gerações da flauta brasileira. Mais informações sobre ele estão aqui no Acervo Origens, juntamente com a postagem de outro disco com suas composições. O disco de hoje, embora cheio de composições de Pattápio, é mais uma das coisas incríveis que Altamiro Carrilho fez. Se os flautistas são os humanos que cantam como os pássaros, Altamiro é o uirapuru, que silencia todos os outros quando entoa o seu canto. Nunca é demais lembrar que a flauta brasileira tem uma estirpe de grande respeito, que nada deve aos grandes flautistas europeus ou de qualquer outro lugar do mundo (podemos citar alguns nomes, como Callado, Pattápio, Pixinguinha, Benedito Lacerda, Dante Santoro, Copinha, Carrasqueira, Manoelzinho, Poyares, Carlos Malta, Eduardo Neves e outros). Mas Altamiro é diferente. Ele destoa de todos os padrões conhecidos, porque chega a limites inimagináveis da técnica e da arte da flauta. Sua fluência na flauta é tamanha, sua familiaridade com o instrumento é tanta que ele verdadeiramente fala com a flauta. Seu talento é tão extraordinariamente fora do normal que Jean Pierre Rampal, um dos maiores flautistas contemporâneos, disse uma vez: Existem os flautistas. E existe Altamiro Carrilho.

Altamiro nasceu em Santo Antônio de Pádua, no Rio de Janeiro, em 1924. Desde os cinco anos, quando via o filho do vizinho tocar uma flautinha de brinquedo, a flauta começou a preencher os sonhos do garoto. Seu pai era dentista, e conseguia dar condições razoáveis para a família. Então, Altamiro freqüentava a escola. Mas, quando ele tinha nove anos, seu pai adoeceu e toda a família teve que se esforçar para botar a comida na mesa. Altamiro começou a trabalhar em uma tamancaria. Depois, passou a trabalhar como prático em uma farmácia. Sua família se mudou para Niterói, e Altamiro pretendia aprofundar seus estudos em farmácia. Nesse período, com 15 anos, ele dispunha de flautinhas de bambu, que ele praticava após o expediente. Havia um flautista, chamado Joaquim Fernandes, que o ensinava algumas coisas da flauta. Foi ele que incentivou Altamiro a comprar uma flauta de segunda mão. Ele ouvia, no rádio, Dante Santoro e Benedito Lacerda, e os imitava, sonhando alto. De posse da flauta, começou a andar nos auditórios das rádios cariocas, para ver os grandes flautistas e para participar dos programas de calouro. Na rádio Tupi, conquistou o primeiro lugar no programa de Ary Barroso, aos 17 anos. Daí então, Altamiro passou a ser conhecido, e cada vez mais requisitado. A primeira gravação foi aos 20 anos, acompanhando o sambista Moreira da Silva. Altamiro participou de vários regionais do rádio, sendo um de grande importância o Regional do Canhoto, que requisitou Altamiro para substituir seu ídolo, o Benedito Lacerda. Em 1955, montou a Bandinha de Altamiro Carrilho, em que tocava flauta e flautim e era acompanhado por um sexteto. Tanto com os regionais de choro quanto com sua bandinha, Altamiro gravou dezenas de discos, todos eles com interpretações impecáveis e espetaculares. Fez também várias viagens ao exterior; são mais de 40 países carimbados em seu passaporte.
Altamiro conseguiu também muito reconhecimento como flautista erudito. Se os diferentes gêneros musicais têm linguagens distintas, Altamiro é o gênio poliglota, porque sua flauta fala qualquer língua. Ele mesmo disse: Eu não acho diferença nenhuma entre o erudito e o popular. A música é uma só. Só existe um tipo de música: a boa.
O disco de hoje tem os talentos de Altamiro como músico popular e erudito; evidencia seu virtuosismo e sua sensibilidade interpretativa. Gravado em 1977, mostra também que, aos 53 anos, Altamiro tinha a força de um garoto de 23. São lindas e dificílimas Primeiro Amor, de Pattápio Silva, e Hora Staccato, de Dinicu. É bela também Despertar da Montanha, de Eduardo Souto.
Hoje, Altamiro, com 82 anos, faz apresentações, ainda que esparsas, porque sua saúde o tem limitado um pouco. Continua, como sempre, bem humorado. Recentemente, em dezembro de 2010, o público de Brasília pode vê-lo, com direito a uma homenagem tocante, organizada pela flautista Dolores Tomé, em que mais de 30 flautistas, ao final da apresentação, tocaram o Carinhoso da platéia. Nesse dia, vimos o mestre com lágrimas nos olhos e voz embargada. Inesquecível, assim como ele e sua obra, que viverão eternamente no sopro de cada flautista brasileiro.




Lado A

            01-Primeiro amor (Pattápio Silva) 
            02-Margarida (Pattápio Silva)
            03-Zinha (Pattápio Silva)
            04-Sonho (Pattápio Silva)
            05- Serata D’amore (Pattápio Silva)
 
      Lado B

01-Serenata Oriental (Ernesto Köller)
02-Despertar da montanha (Eduardo Souto)
03-Canção triste (Tchaikowsky)
04-Hora Staccato (Dinicu)
05-Canção primavera (Mendelssohn)
06-A galope (Altamiro Carrilho)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Jackson do Pandeiro - Isso é que é forró (25/08/2011)

Jackson do Pandeiro nasceu como José Gomes Filho, em 31 de Agosto de 1919, em um casebre na zona rural no município de Alagoa Grande, na Paraíba. Seu pai era o oleiro José Gomes, e sua mãe, a cantora de côco Flora Maria da Conceição. O menino Zé cresceu solto no mato, nunca freqüentou escola alguma, e até 1930 não se poderia imaginar que seu futuro lhe reservava o título de “rei”.  Alagoa Grande tinha a peculiaridade de ter um universo musical bem rico; tinha cantadores de côco, entre os quais a mãe de Jackson, cujo nome artístico era Flora Mourão, figurava entre os melhores; ficava próximo de um remanescente de Quilombo, o Caiana dos Crioulos, que trazia uma preciosa herança musical africana; lá tinha também uma escola de música, em que poucos privilegiados tiveram acesso a algum ensino formal de música. Não foi o caso de Jackson. Sua mestra, e seu ícone, por toda a vida, foi sua mãe, a guerreira do côco Flora Mourão. Ela era, como ele, mulata, magra, pobre; andava com um vestido branco surrado, que Jackson carregou na mala até o último dia de sua vida. Quando José Gomes faleceu, Flora casou-se com outro José, com quem teve mais dois filhos. O segundo José era, porém, valentão e cachaceiro. Uma vez, chegando em casa bêbado, tentou agredir Jackson. Foi a única e derradeira vez, porque Flora botou o cabra para correr. Daí ela ficou só com os filhos, e tinha que dar conta de tudo. O dinheiro ela fazia cantando os cocos em qualquer lugar que fosse chamada. Ela cantava com o tal vestido branco, um único sapato que lhe pertencia e um lenço perfumado, que enrolava no pescoço. Quando a apresentação acabava, o lenço recebia os escambos: leite, pão, moedas, notas. Ela o chamava de lenço da sorte. Mais tarde, Jackson o utilizava quando precisava da força espiritual do lenço e de sua mãe. Flora cuidava dos filhos e da casa também, e conseguia fazer umas rodas de côco domésticas. Nelas, Jackson, que ainda era o pequeno Zé, com apenas 7 ou 8 anos, ficava vendo e ouvindo tudo, e fazendo a marcação do ritmo com o pé. Os instrumentos, a zabumba e o ganzá, ficavam pendurados na parede da sala, e despertavam os sonhos de Jackson, de tocá-los com a intimidade de sua mãe e do zabumbeiro que a acompanhava, chamado João Feitosa. Um dia, ele faltou. O menino José ouvia a lamentação da mãe, e percebeu sua angústia pela falta do homem. José, com sete anos, subiu no tamborete, alcançou a zabumba e gritou: “Mãe, agora não precisa mais de Seu João Feitosa nem de ninguém. Eu já sei tocar o bumbo”. Três anos depois, Jackson já ocupava o lugar do zabumbeiro nas tocatas de sua mãe.
A vida inteira de Jackson foi, do mesmo modo como sua infância e iniciação musical, rica, interessante e repleta de passagens emocionantes. Ele gravou dezenas de discos. O que o Acervo Origens disponibiliza hoje foi o último de sua carreira, lançado em 1981, um ano antes de sua morte. O último disco de nosso rei tem a maturidade dos 29 anos de carreira artística, juntamente com o vigor de alguém que nunca abandonou a juventude. Destaco a faixa 5 do lado B, “Bola de Pé em Pé”, uma homenagem de Jackson ao Flamengo, uma de suas maiores paixões. Muito boa também é “Mundo Cão” (faixa 3 do Lado B).


Lado A

1-Cabeça feita (Jackson do Pandeiro-Sebastião Batista da Silva)
2-Tem pouca diferença (Durval Vieira)
3-Herança de meu pai (Benício Guimarães)
4-Mãe solteira (Severino Ramos-Antonio Rodrigues)
5-Samambaia trepadeira (Gervásio Horta)
6-Eu vou pra lá (Benício Guimarães)

  Lado B

1-Competente demais (Valdemar Lima-Jackson do Pandeiro)
2-Quem tem um não tem nem um (Durval Vieira-Jorge Paulo)
3-Mundo cão (Jackson do Pandeiro-Rogéria Ribeirão)
4-São Tomé (Assunção Corrêa-Jackson do Pandeiro)
5- Bola de pé em pé (Jackson do Pandeiro-Sebastião Batista da Silva)


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Batucada Espetacular de escola de Samba (24/08/2011)

Olha aí mais um disco de samba didático, cujo objetivo é mostrar o samba, não como gênero, mas como ritmo, aos gringos. Sim, porque o subtítulo do disco é em inglês: Authentic Sounds of Native Percussion and Rythms from Brazil. Tem também um texto, tentando explicar o que é o samba, na contracapa, nas versões em português e inglês. Além disso, as músicas não têm letra, não têm harmonia (violão, cavaquinho) e também não têm melodia. É só a batucada mesmo. Todas elas são de autoria de Pepê, Chamego e Loló, que não sabemos quem eram e o que faziam. Um deles, certamente, tocava cuíca. Aliás, a cuíca nesse disco é algo impressionante. Ela fala o disco todo, é a solista do disco. Fora a cuíca, também é interessante identificar as diferentes levadas de samba que as baterias de escola de samba são capazes de realizar. O disco foi gravado pela Tapecar, uma gravadora reconhecidamente comprometida com o samba e com os sambistas. Então, a batucada é de altíssima qualidade. Vale a pena escutar, é uma verdadeira aula de samba.


Lado A

1-Esquentando o couro (Pepê, Chamêgo, Loló)
2-Cuica quente (Pepê, Chamêgo, Loló)
3-De leve (Pepê, Chamêgo, Loló)
4-Descendo o morro (Pepê, Chamêgo, Loló)
5-Vem chegando a escola (Pepê, Chamêgo, Loló)
6-Saindo da vila (Pepê, Chamêgo, Loló)

Lado B

1-Isso é samba (Pepê, Chamêgo, Loló)
2-Apito na quadra (Pepê, Chamêgo, Loló)
3-Tamborins de respeito (Pepê, Chamêgo, Loló)
4-Sapato desamba (Pepê, Chamêgo, Loló)
5-Já esquentou (Pepê, Chamêgo, Loló)

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Quinteto Violado - A Feira (23/08/2011)

O Quinteto Violado é um grupo surgido no início da década de 1970, no estado de Pernambuco (tem um texto sobre ele aqui no blog - http://www.acervoorigens.com/2007/04/quinteto-violado.html). A proposta do grupo era pesquisar ritmos e gêneros populares brasileiros, e fazer um som que misturasse as influências musicais de seus integrantes com a riqueza musical brasileira, com ênfase nos ritmos nordestinos.  Esse disco, de 1974, é associado a uma montagem cênica, cujo tema são as feiras do interior do nordeste. O disco tem clássicos da música nordestina, como Assum Preto, e composições próprias, como  a deliciosa Dona Aninha. E tem também arranjos lindíssimos para Procissão, de Gilberto Gil, Disparada, de Geraldo Vandré, e Ave Maria, de Caetano. Maravilhoso esse disco!


     Lado A

1-Assum preto (Humberto Teixeira – Luiz Gonzaga)
2-Pau de Arara (Luiz Gonzaga – Guio de Moraes)
3-Procissão (Gilberto Gil)
4-O gemedor (Gilvan Chaves)
5-Ave Maria (Caetano Veloso)
6-Dona Aninha (Toinho Alves – Roberto Santana)

Lado B

1-Disparada (Geraldo Vandré – Théo)
2-Terra terra (Toinho Alves – Marcelo Melo)
3-A lua girou (Fernando Lona – Julio Ricardo)
4-Ave Maria dos retirantes (Alcivando Luz – Carlos Coqueijo)
5-O bom vaqueiro (Poema de Zé da Luz – adapt. De Roberto Santana – Marcelo Melo)

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Luiz Gonzaga O Homem da Terra (19/08/2011)

Luiz Gonzaga nasceu em 13 de dezembro de 1912, na fazenda Caiçara, em terras do barão de Exu, e foi o segundo de nove filhos do casal Januário José dos Santos e Santana Batista de Jesus, que na pia batismal da matriz de Exu, recebe o nome de Luiz (por ser o dia de Santa Luzia) Gonzaga (por sugestão do vigário) Nascimento (por ter nascido em dezembro, também mês de nascimento de Jesus Cristo). Seu pai, o famoso velho Januário, era um conhecido tocador da sanfona de 8 baixos, e incentivava os filhos a aprenderem música. Luiz foi o que mais se aproximou da música. Aos 8 anos,  já tocava nas festinhas em Exu, Araripe e municípios próximos. Quando completou 16 anos, já era muito conhecido de toda a região. Na década de 1920, Luiz tocou pela região do Araripe; em 1929, apaixonou-se por Nazarena, da família Saraiva. Mas o pai dela, o coronel Raimundo Delgado, não gostou da história, e ameaçou Luiz Gonzaga de de morte. Avisados pelo próprio Delgado, Januário e Santana aplicam uma surra em Luiz que, revoltado, decide fugir de casa, indo a pé até o Crato onde vende a sua sanfoninha  por 80 mil réis. Solto no mundo, Luiz acaba se alistando no exército. Assim, viajou muito, como corneteiro do exército, com o apelido de "bico de aço".Saiu do exército e rumou para o Rio de Janeiro, e foi praticamente aí que iniciou sua vida artística. Importante é lembrar que o Rio de Janeiro, nesse período, era o lugar que aglutinava artistas de vários lugares do país; lá, então, havia a convivencia e a mistura de vários gêneros musicais. Além disso, era lá que estavam se instalando as primeiras gravadoras multinacionais, e era lá o centro da produção cultural. Então, o Rio era mesmo o lugar dos artistas. As primeiras apresentações de Luiz Gonzaga foram em casas noturnas e cabares no centro do Rio. Seu repertório, no início da carreira, era composto por valsas, tangos, blues e choros. Nada de baião, xaxado nem xote. Diz a lenda que foi um grupo de estudantes cearenses que provocou Luiz Gonzaga para que ele tocasse coisas do norte. Ele tocou Vira e Mexe  e Pé de Serra. Foi esse encontro que desencadeou a mudança no repertório de Luiz, que voltou às suas origens nordestinas. Vira e Mexe foi vencedora, em 1940, do mais temido programa de calouros da TV brasileira, apresentado por Ary Barroso. Dizem que Luiz saiu ovacionado pelo público e pelos jurados. Foi graças a esse programa que a carreira artística de Luiz começou a acontecer. Outros contratos surgiram, inclusive para participar de gravações de discos. Nesse período, Luiz não se atrevia a cantar. Quando fazia isso, os produtores musicais e radialistas o reprimiam, porque achavam sua voz anasalada. Então, Luiz começou mesmo a se destacar como instrumentista, como sanfoneiro.
Mesmo com a idéia que predominava, entre os produtores e radialistas, de que a voz de Luiz Gonzaga não era boa porque não combinava com a estética vocal dos grandes cantores do rádio da época, como Vicente Celestino, Nelson Gonçalves e Orlando Silva, Luiz insistia em cantar. Ao mesmo tempo, não era fácil encontrar um bom intérprete para os ritmos nordestinos. Então, diante da insistência do próprio Luiz, ele acabou gravando a música Dança Mariquinha. Mesmo depois disso, a implicância com a voz de Luiz era tanta que, na Rádio Nacional, afixaram um cartaz na parede, com os seguintes dizeres: "Luiz Gonzaga está proibido de usar microfone de lapela". Mas ele insistiu muito, e gravou mais composições suas, que fizeram sucesso, e sua voz começou a ser ouvida na Rádio nacional também. Foi por esse período, em meados da década de 1940, que Luiz começou a botar para funcionar o seu ambicioso projeto, o de criar um gênero musical, inspirado no folclore de sua região natal, que mostrasse o nordeste para o resto do Brasil; além disso, ele sabia que, nessa época, havia grande migração de nordestinos para os grandes centros do país. Então, Luiz queria fazer uma música com a qual essas pessoas se identificassem. Saiu à procura de um parceiro que tivesse sensibilidade musical nordestina, e que fosse capaz de mostrar toda a beleza cultural do nordeste, para aguçar, nos migrantes, o orgulho de suas raízes. Encontrou Humberto Teixeira. Literalmente, eles "inventaram" um gênero, e apresentaram o baião para todo o Brasil. Luiz se identificava como um estilizador de um ritmo que já existia no nordeste; ele afirma que sua atuação se deu ao montar a formação instrumental - sanfona, zabumba e triângulo -, que era acessível ao meio urbano. Em 1972, ele disse o seguinte, em entrevista à revista veja: "o baião foi idéia minha e do Humberto Teixeira. Quando mostrei o baião para ele, surgiu a idéia de um gênero novo. Mas o baião já existia como coisa do folclore. Eu tirei do bojo da viola do cantador". Por isso, de fato, embora inspirado na tradição musical nordestina, Luiz Gonzaga inventou o baião como gênero da música popular brasileira, e podemos dizer que isso aconteceu em 1946. As suas letras evidenciam também essa intenção, de mostrar algo novo ao Brasil. Um de seus maiores sucessos, a música de nome "baião", foi feita em parceria com Humberto Teixeira, e ensina o que é o gênero e como dançá-lo.
A carreira de Luiz Gonzaga teve altos e baixos, momentos em que ele fez muito sucesso, e outros bem difíceis. Teve,também, grandes parceiros, como Humberto Teixeira e Zé Dantas. Luiz também foi padrinho de grandes nomes da música nordestina, como Dominguinhos e Marinês. Luiz Gonzaga faleceu no dia 02 de agosto de 1989, vítima de osteoporose, no Hospital Santa Joana, na capital pernambucana. Foi sepultado em seu município natal. Alguns meses antes, na última apresentação que ele fez na vida, no dia 06 de junho de 1989 no Teatro Guararapes do Centro de Convenções de Recife, Luiz Gonzaga disse: “Quero ser lembrado como o sanfoneiro que amou e cantou muito seu povo, o sertão; que cantou as aves, os animais, os padres, os cangaceiros, os retirantes, os valentes, os covardes, o amor. Este sanfoneiro viveu feliz por ver o seu nome reconhecido por outros poetas, como Gonzaguinha, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Alceu Valença. Quero ser lembrado como o sanfoneiro que cantou muito o seu povo, que foi honesto, que criou filhos, que amou a vida, deixando um exemplo de trabalho, de paz e amor. Gostaria que lembrassem que sou filho de Januário e dona Santana.  (...) Muito obrigado." Hoje, temos absoluta certeza de que ele nunca será esquecido. Luiz Gonzaga é, a cada dia, mais admirado e reverenciado. Ele é um dos pilares da música popular brasileira, uma de suas maiores expressões. Quanto mais o tempo passa, mais percebemos a genialidade de um homem cuja obra nunca deixará de ser atual.
O disco de hoje, gravado em 1980, tem grandes sucessos, como Estrada de Canindé e Siri Jogando Bola. Destaco a música Triste Partida, que virou um verdadeiro manifesto sertanejo na voz de Luiz Gonzaga.


Lado A

1-Mamulengo (Luiz Bandeira)
2-O homem da terra (Walter Santos – Tereza Souza)
3-A triste partida (Patativa do Assaré)
4-Siri jogando bola (Luiz Gonzaga – Zé Dantas)
5-Estrada de Canindé (Humberto Teixeira – Luiz Gonzaga)

Lado B

1-Lá vai pitomba (Luiz Gonzaga – Onildo Almeida)
2-O monte (maquinista e sacristão) (Luiz Bandeira)
3-Cananã (Venâncio – Aparício Nascimento)
4-O adeus da Asa Branca (Tributo a Humberto Teixeira) (Dalton Vogeler)
5-Cego Aderaldo (João Silva – P. Maranguape)
6-Tropeiros da Borborema (Rosil Cavalcanti)

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Repentes e Repentistas Violeiros (18/08/2011)

Há pouca ou quase nenhuma informação sobre a biografia dessa dupla que é da maior importância para o repente. Sabe-se que José Vicente do Nascimento nasceu no dia 7 de agosto de 1922, em Pocinhos, Paraíba. Até os 14 anos morou na cidade paraibana, Taperoá. Depois, mudou-se com a família para o Sítio Umburana que, na época, pertencia ao município de São José do Egito e hoje é Distrito de Itapetim. Zé Vicente da Paraíba era membro da Academia Caruaruense de Literatura de Cordel e dizia que não podia viver sem cantar e escrever. Ele era um poeta de grande envergadura. Sobre sua vida, um de seus versos dizia: “Fiz do choro das cordas da viola o maior ganha-pão da minha vida”. Ele faleceu recentemente, no dia 10 de maio de 2008, vítima de falência múltipla dos órgãos. Esse disco, gravado em 1972, é uma das principais referências do repente. Zé Vicente da Paraíba é uma figura lendária entre os cantadores do nordeste. Ele ganhou relativa notoriedade na década de 1970, porque Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Elba Ramalho e Zé Ramalho gravaram alguns de seus versos. Seu trabalho mais conhecido é “Quanto é grande o autor da natureza” (Faixa 1 , Lado A), que foi, inclusive, regravado por esses mesmos artistas.


Lado A

1- Quanto é grande o autor da natureza - Mote  (José Vicente da Paraíba – Passarinho do Norte)
2- Mote de amor - Tema (José Vicente da Paraíba – Passarinho do Norte)
3-Beira - mar - Trocado (José Vicente da Paraíba – Passarinho do Norte)
4-Quando eu ia ela voltava - Rojão (José Vicente da Paraíba)
5-Mourão - Voltado (José Vicente da Paraíba – Passarinho do Norte)
6-Um passado feliz - Voltado (Passarinho do Norte)

Lado B

1-Coco-Rojão-Brasileiro  – Coco Rojão (José Vicente da Barbosa – José Barbosa)
2-Aboio de gado e rosa – Modinha com aboio (Zé Pernambuco)
3-Martelo - Alagoano (José Vicente da Paraíba – José Barbosa)
4-Recado de violeiro - Baião  (José Vicente da Paraíba)

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Luperce Miranda de ontem e sempre (17/08/2011)

Para apresentar Luperce Miranda, ninguém melhor do que o grande nome do bandolim contemporâneo: Hamilton de Holanda. Esse texto é o prefácio do livro Luperce Miranda: O Paganini do Bandolim, de Marília Trindade Barboza (Editora da Fonseca, 2004). Então, Luperce Miranda por Hamilton de Holanda:

Luperce. Esse nome diz muito. Nascido e criado em Recife, o menino de muitos irmãos cresceu em um ambiente musical que o formou como profissional. Desde muito novo, seu talento já encantava quem o escutava. Na verdade, escrevo essas linhas para falar da importância de Luperce para a música popular brasileira, mais espeficicamente para a história do Bandolim brasileiro. O Bandolim, como alguns outros instrumentos, chegou ao Brasil pelas mãos dos europeus. E aqui se transformou em um dos mais importantes e originais de nossa tão rica música. Original porque aqui se criou um jeito de tocar único e admirado em todo o mundo. Nossa escola é completa, seja pelo repertório, seja pela técnica, seja pela obra. E é aí que entra o mágico Luperce Miranda. Foi um dos primeiros a colocar o bandolim em uma posição de solista de destaque no regional brasileiro. Deixou uma bela obra, entre discos, interpretações e composições. E o principal: contribuiu de forma definitiva para a formação de uma técnica sólida e virtuosística. Vendo Luperce tocar, até parecia fácil. Seus dedos passeavam pelo braço do instrumento. E ele tinha essa facilidade em qualquer parte da escala de seu nobre instrumento. Digo isso porque quanto mais perto da boca do bandolim, menores as casas, menor o espaço para os dedos e maior a dificuldade. E para ele era moleza. Claro que a custo de muitas horas de cumplicidade. Conhecia muito bem os acordes. Sabia usar o virtuosismo em prol de sua música.  Cito como exemplo a Valsa Concerto “Quando me lembro”. Os dedos percorrem praticamente toda a extensão possível. E que beleza de obra. Linda, difícil, alegre, triste. Considero esta música um desafio para o bandolinista que quer atingir o nível máximo de técnica, se é que isso existe. Mas nem só de técnica vivia Luperce. Vide “Alma e Coração”. Profundidade, senso estético, brasilidade. Talvez seja porque ele era pernambucano, talvez porque tenha vivido muitas emoções com as mulheres. O certo é que composições como “Alma e Coração” contrariam os que dizem que Luperce era só técnica. (...).
Esse disco, gravado em 1970, pelo Museu da Imagem e do Som, marca a volta de Luperce às gravações, depois de um período de mais de uma década sem gravar nada. Ele traz bonitas valsas, e evidencia aquilo que Hamilton já disse, que Luperce não era só técnica, porque sua sensibilidade na interpretação é admirável. Destaco a valsa, de autoria dele, Fala Coração (Faixa 5 do lado A). É linda também a valsa Santinha, de Anacleto de Medeiros, assim como são belas as interpretações de Luperce para choros clássicos, como Pedacinhos do Céu, de Waldir Azevedo, e Tico-tico no Fubá, de Zequinha de Abreu.


Lado A

1-Já Te digo – Chôro (Pixinguinha)
2-Saudades de Matão – Valsa (Raul Torres-Jorge Galatti)
3-Santinha – Xotis (Anacleto de Medeiros)
4-Tico-tico no fubá – Chôro (Zequinha Abreu)
5- Fala coração – Valsa (Luperce Miranda)
6-Querida de todos – Polca (Antonio S. Calado)
7- Por um beijo – Valsa (Catullo da Paixão Cearense - Anacleto Medeiros)

Lado B

1-Chão de estrelas – Valsa (Orestes Barbosa-Silvio Caldas)
2-Odeon – Chôro (Ernesto Nazareth)
3-Janete – Valsa (Luperce Miranda)
4-Pedacinho do céu – Chôro (Waldir Azevedo)
5-Um beijinho pra você - Marcha(Luperce Miranda)
6-Saudades de Ouro Preto – Valsa (Antenogenes Silva)
7-Flôr amorosa – Choro (Antonio S. Callado

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Os Três do Nordeste - É proibido cochilar (16/08/2011)

Esse é um clássico dos clássicos dos salões de forró. Esse trio paraibano, que já teve diversas formações ao longo de quase 40 anos de existência, sempre esteve entre os melhores. O trio surgiu em 1969, com o nome Trio Luar do Sertão, formado por Parafuso, Zé Cacau e Zé Pacheco. Em 1972, adotou o nome Três do Nordeste.  Esse é o segundo disco do grupo, uma preciosidade que traz músicas que até hoje são obrigatórias no arrasta-pé, como É proibido cochilar e Homem com H. A produção é de Abdias. Ou seja, o negócio é bom. Nunca é demais lembrar que Os Três do Nordeste andam por aí fazendo shows e apresentações no Brasil inteiro. Eles fazem mais de 30 apresentações por mês. Quem nunca foi, não perca a oportunidade, porque esse trio é história viva do forró.  No blog, tem outro disco deles, mais recente (http://www.acervoorigens.com/2008/12/os-3-do-nordeste.html) .
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Lado A

1-Voltar pra Bahia (Osvaldo Oliveira – Mary Monteiro)
2-É proibido cochilar (Antonio Barros)
3-Homem com H (Antonio Barros)
4-Ta faltando alguém (Severino Ramos – Joel Rohen)
5-Eu era feliz (Parafuso – Antonio Ceará)
6-Forro em São Miguel (Antonio Barros)

Lado B

1-Estorei no Norte (Zé Gilmar – Dibarrios)
2-Trabalha Mane (Zé Luiz)
3-Brasil expresso (Joça de Castro – Oscar Barbosa)
4-Meu grande amor (Parafuso – Antonio Ceará)
5-O casamento da Raque (Joca de Castro)
6-Eu vou meu bem (Parafuso – Antonio Ceará)

sábado, 13 de agosto de 2011

Programa Acervo Origens - Sábado (13.08.2011)

Sábado no Programa Acervo Origens:
as violas e as poesias de Ivanildo Vilanova e Geraldo Amâncio, o bandolim de Joel Nascimento, a Banda de Pau e Corda e o incrível encontro de Solange Maria e Adauto Santos.

Programa Acervo Origens, sábado às 19h na Rádio Nacional Brasília FM 96,1 ou on line no www.acervoorigens.com
Apresentação: Cacai Nunes

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Canoeiro - Os grandes sucessos de Zé Carreiro e Carreirinho (12/08/2011)

Zé Carreiro, cujo nome é Lúcio Rodrigues de Souza, nasceu em 1922, em uma fazenda no município de Santa Rita do Passa Quatro. Adolescente, mudou-se para São Paulo, onde começou a cantar modas de viola. No final dos anos 40, conheceu Adauto Ezequiel, o Carreirinho. Sobre ele, há um episódio curioso: Adauto tinha ascendência alemã, e seu sobrenome seria Humziker. O escrivão achou o nome muito complicado, e acabou registrando o menino como Adauto Ezequiel. Em 1950, a dupla gravou, na Continental, o primeiro 78 rpm, com as músicas Canoeiro (cururu) e Ferreirinha (moda de viola). Permaneceram juntos até 1958, mas ambos fizeram carreira cantando em outras duplas. A dupla Zé Carreiro e Carreirinho é considerada uma das mais importantes da música caipira. Zé Carreiro faleceu em 1970 na cidade de São Paulo. Ele gravou mais de 50 discos de 78 rpm, dois compactos e alguns LPs. Carreirinho tem cerca de 1680 músicas de sua autoria gravadas. Ele é, juntamente com Raul Torres, Serrinha, Tinoco e Zé da Estrada, considerado uma das melhores vozes da música caipira. Carreirinho faleceu, aos 87 anos, em março de 2009. Esse disco, lançado em 1978, é uma coletânea de sucessos anteriores. Destaco a faixa 1 do Lado A (Canoeiro), e a faixa 1 do Lado B (Ferreirinha), por serem as primeiras músicas da dupla a serem gravadas.


Lado A

1-Canoeiro – Cururu (Zé Carreiro-Alocin)
2-A  morte do Carreiro – Moda de viola (Zé Carreiro -Carreirinho)
3-Boi Soberano – Moda de viola (Carreirinho-Izaltino Gonçalves de Paula- Pedro Lopes de Oliveira)
4-Pirangueiro – Cururu (Zé Carreiro)
5-Preto fugido – Moda de viola (Zé Carreiro)
6-Cruel destino – Moda de viola (Carreirinho)
7-Bombardeio-Moda de viola (Zé Carreiro-Geraldo Costa)

Lado B

1-Ferreirinha – Moda de viola (Carreirinho)
2-Saudades de Araraquara – Cururu (Zé Carreiro)
3-Duas cartas – Cateretê (Zé Carreiro-Carreirinho)
4-Flor proibida – Cateretê (Zé Carreiro-Carreirinho)
5-Sucurí - Cururu (Zé Carreiro-Ado Benatti)
6-Último adeus - Valseado (José Fortuna-Fernandes)
7-As três cuiabanas-Moda de viola (Zé Carreiro-Carreirinho)

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Viva a Bahia N°2 (11/08/2011)

 O disco de hoje faz parte de uma iniciativa fundamental para a manutenção de algumas tradições folclóricas brasileiras, principalmente a capoeira. A mentora da iniciativa é Emília Biancardi, uma etnomusicóloga especializada na música brasileira, com ênfase naquelas ligadas a festas, rituais e folguedos, como a capoeira, o candomblé, o maculelê, o samba de roda.  Ela nasceu em Salvador, Bahia, e viveu sua infância e parte da adolescência em Vitória da Conquista, interior do Estado. Lá, teve os primeiros contatos com os folguedos populares que vieram a ser objeto de seu interesse por toda a vida. Em 1962, foi nomeada professora de canto do Instituto Normal Isaías Alves, o colégio ICEIA. A responsável pela nomeação foi Maria Rosita Salgado Góes (que fez as adaptações das músicas desse disco). No ICEIA, Emília Biancardi criou o grupo "Viva Bahia", o primeiro grupo parafolclórico do Brasil. O grupo estreou um espetáculo em 1963, na Semana de Música. Eles criaram coreografias para a puxada de rede, para o maculelê, para o candomblé e para a capoeira, inspirados nos passos originais dessas manifestações, e utilizando sua música. Biancardi agregou, para concepção e realização do espetáculo, mestres portadores de conhecimento sobre cada uma dessas tradições: Mestre Popó (José de Almeida Andrade, de Santo Amaro), para o maculelê; Negão Doni (Gilberto Nonato Sacramento), Dona Coleta de Omolu (Clotildes Lopes Alves) e Seu Edson (Edson Santos) para o candomblé; Mestre Acordeon (Ubirajara de Almeida) e Camisa Roxa (Edivaldo Carneiro dos Santos) para a capoeira. O Viva Bahia fez turnê pelo Brasil e exterior, divulgando a capoeira, o maculelê, o candomblé e a puxada de rede. Interessante é constatar que os grupos contemporâneos de capoeira trazem o maculelê, a puxada de rede e o samba de roda em suas práticas; os capoeiristas, nos rituais de ingresso, formaturas e graduações, costumam realizar apresentações onde o maculelê, a puxada de rede e o samba de roda têm lugar. Diz-se que a inclusão deles no universo da capoeira se deu justamente em função dos espetáculos montados por Emília Biancardi e pelo grupo Viva Bahia. Pode-se dizer, então, que Emília Biancardi criou uma tradição, a de agregar o maculelê, o samba de roda e a puxada de rede aos rituais da capoeira.
Em 1968, o espetáculo realizado no Teatro Castro Alves, em Salvador deu origem a este disco. O disco foi gravado em mono, e a captação do som está longe de ser ideal. O lado A tem apenas uma faixa, com diversas cantigas do candomblé. O lado B tem duas faixas, uma com corridos e chulas da capoeira, emendados um no outro, e que até hoje fazem parte das rodas de capoeira; a outra faixa apresenta sambas de roda, tocados com berimbau, além, é claro, de outros instrumentos. O samba de roda é executado conforme os capoeiristas tocam atualmente (observem que esse samba de roda é diferente daquele que hoje é realizado no recôncavo baiano, por grupos como os Filhos da Pitangueira). Esse disco tem, portanto, inestimável valor histórico, porque registrou um momento importante para a capoeira e para outros folguedos praticados na Bahia.

  
Lado A

 1-Candomblé de kêto (Rec. Adapt. Por Maria Rosita Salgado Góes)

Lado B

1-Samba de roda (Rec. Adapt. Por Maria Rosita Salgado Góes)
2-Capoeira (Rec. Adapt. Por Maria Rosita Salgado Góes)